Vários estudos sobre esse período, calculam que o Brasil recebeu o maior volume de negros traficados, algo em torno de 4,9 milhões
Foto: Divulgação
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O mês de novembro é marcado pela celebração de duas datas que objetivam marcar a luta contra o racismo em nosso país. No dia 19 de novembro se celebra Zumbi dos Palmares e em 20 de novembro o Dia da Consciência Negra. São dois dias em que o Brasil deveria se olhar no espelho e no retrovisor da história e fazer uma reflexão sobre a relação com as pessoas negras e, especial, como superar a discriminação racial.
A história do nosso país se confunde com a escravidão, foram 388 anos em que pessoas eram sequestradas na África e enviadas para o Brasil, para atuarem nos mais diferentes ramos de nossa economia. Vários estudos sobre esse período, calculam que o Brasil recebeu o maior volume de negros traficados das Américas, algo em torno de 4,9 milhões de africanos.
O escritor Laurentino Gomes em seu livro ‘Escravidão’, conta que a intensidade do tráfico negreiro entre o Brasil e os portos da África, em navios negreiros lotados de escravos e nas piores condições possíveis de higiene, criou uma situação inusitada. O trajeto dessas embarcações devido ao grande número de negros que morriam acabou por mudar a rota dos tubarões no Oceano Atlântico, que seguiam os navios da África ao Brasil aguardando pelos cadáveres que eram atirados ao mar. Acredita-se que morria uma média de catorze escravos por dia durante a viagem e que 600 mil faleceram durante os séculos que perduraram a escravidão.
Mas o sofrimento não acabava quando chegavam em terra firme, na maior parte dos casos, seria apenas o início de uma nova fase de mais tortura e trabalho forçado, que reduzia consideravelmente, e expectativa de vida dessas pessoas. O historiador americano Stuart Schwartz calcula que, no fim do século 19, a expectativa de vida dos escravizados no Brasil era de menos de 19 anos, enquanto a dos não escravizados era de 27 anos.
Essa situação teve um ‘fim’ em 1888, quando foi assinada a Lei Áurea, que também deu ao Brasil, o título de último país a abolir a escravidão no mundo. Esses mais de três séculos deixaram raízes profundas em nossa sociedade em vários aspectos dela, como na música, na religiosidade, na culinária e entre outros. Porém, apesar da imensa contribuição da raça negra, o Brasil carrega a triste marca do racismo que insiste em mostrar todos os dias que, apesar dos esforços, igualdade racial e oportunidades é algo que ainda vai demorar um bom tempo.
O último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2022, mostrou que negros (pretos e pardos) representam a maior parte da população brasileira, com 56,1%. Entretanto, essa massa populacional enfrenta desigualdades sociais e racismo estrutural, apesar do crescimento da autodeclaração e da crescente visibilidade da cultura afro-brasileira.
A advogada e professora universitária Luciane Pinto, avalia que a escravidão foi algo que trouxe benefícios econômicos para o Brasil, que se destacou na produção de café, açúcar, minérios, porém, quando deixou de ser interessante, os negros foram descartados, como um objeto que perdeu a utilidade.

A advogada Luciane Pinto, as pessoas aprendem a ser racistas desde muito cedo por conta da estrutura racista do país.
“O Brasil foi forjado numa estrutura que se valeu do trabalho do povo preto durante séculos e quando não precisaram mais dos seus serviços os abandonaram, dando a liberdade de não ser mais a coisa de alguém. Mas sem nenhuma estrutura o que fez com que o povo ocupasse os morros e os espaços que ninguém mais queria. Eu penso que foi aí que nos acostumaram a ‘se virar para sobreviver’ e a maioria de nós, desde os nossos ancestrais, continuou se virando para sobreviver. Como estudar e precisa trabalhar para comer, pagar aluguel, luz, água. E quando tem família, então, com filhos para sustentar. Aqui nem vou entrar, mas seria perfeitamente cabível falar do povo preto periférico cooptado pelo crime organizado depois abandonado nas cadeias do nosso país”, afirmou.
Perguntada se as pessoas nascem racista ou aprendem a ser, Luciane, não hesitou em afirmar que é algo que se aprende. “Como o livro do professor Howard Zinn, eu acredito que as pessoas aprendem a ser racistas desde muito cedo por conta da estrutura racista. E não lembro quem disse isso, mas se aprendemos a ser racistas, podemos aprender a sermos gente!”, frisou.
Rosenilda Ferreira de Souza Silva, conhecida como Rosa Negra, é uma ativista das causas sociais, coordenadora nacional do Movimento Negro Unificado (MNU), além de diretora do Sintero (Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Rondônia).
Para ela, o mês de novembro com essas duas datas que tratam da questão do racismo, são importantes, porém, é necessário ter em mente que o cotidiano nos mostra o que a raça negra precisa enfrentar e como sofre com o racismo todos os dias.
“O Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra é um marco de memória, resistência e afirmação da identidade do povo negro. É o dia de honrar Zumbi dos Palmares, símbolo de liberdade, e de reconhecer que a abolição não significou igualdade. Já o Dia Nacional de Combate ao Racismo nos lembra que essa luta é diária. Não é apenas uma data para celebrar, mas para transformar”, declarou.

Para a professora Rosa Negra, as mulheres negras sofrem com o racismo e com o machismo
Rosa Negra observa também que essa batalha contra o racismo está em todos os campos da nossa sociedade. Para ignorá-lo, frisou, são criadas falsas afirmações que servem como máscaras para esconder a face cruel da questão racial no Brasil, onde, quem sente mais é o sexo feminino.
“Sim, o Brasil é um país racista. O racismo estrutura as relações sociais, econômicas e políticas. Ele está nas escolas, nas empresas, na política, na mídia. É o racismo que determina quem tem oportunidades e quem é excluído. E o mito da democracia racial só serve para esconder essa realidade. Para nós, mulheres negras, o racismo é ainda mais cruel. Sofremos a interseção do racismo e do machismo. Somos as que mais enfrentam desemprego, violência doméstica e exclusão dos espaços de poder. Mas também somos as que mais constroem caminhos de esperança, lideram movimentos e sustentam a comunidade. Queremos resistir, mas também viver com dignidade e bem-viver”, finalizou.
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