Os ribeirinhos brasivianos do rio Mamu – fronteira Brasil-Bolívia – foram vítimas de uma espoliação fraudulenta e desditosa, imposta por uma maquinação xenófoba internacional que de forma aviltante escorraçou as suas coletividades do lugar, mostrando ao mundo a face desdenhosa de um imbróglio diplomático que culminou com a expulsão humilhante desses extrativistas dos seringais nativos do Departamento de Pando a partir da primeira década do século XXI.
A desapiedade descabida de um Estado nacional tacanho e reacionário, possuído por seus atos belicosos e exacerbados, esfacelou tradicionais modos de vida, provocou a derrocada de inúmeras famílias, desterritorializou remanescentes do primeiro e segundo ciclos da borracha, desalojou almas e seus devaneios poético-mitológicos, arruinou cotidianidades ancestrais, arrancou sonhos e bem viver, e exterminou todo um mundo simbólico-ontológico-cosmogônico da memória coletiva beiradeira.
Na fronteira em pé de guerra ou na guerra silenciada, grupos paramilitares fortemente armados – também usados como massa de manobra – criaram um verdadeiro campo de concentração fluvial, adotaram práticas visivelmente facciosas, transformaram um lugar, até então, virtuoso e impoluto, num lugar ignóbil e tenebroso, execraram a vida e o lar, e julgaram e condenaram essas coletividades à revelia da declaração universal dos direitos humanos.
Sem os brasivianos as águas e as matas perderam as suas encantarias, as relações estetizantes do homem com a terra foram afrontosamente extirpadas, as peculiaridades culturais foram abominadas sem complacência, os valores ontológicos do ser foram ardilosamente afugentados, e a viscosidade da exuberância cósmica ribeirinha foi perniciosamente condenada ao malogro.
Eles foram alijados e obliterados do lugar, eles foram vítimas de um governo despótico e tirano, eles foram debilitados pela defraudação e degradação humana, eles foram sacrificados por um tratamento hostil e desmoralizante, e eles foram desterrados pela devassidão discrepante da aversão ao outro. Eles foram compelidos pelo ódio.